terça-feira, 6 de outubro de 2009

Artigo - O tabu da morte na sociedade, por Sérgio Roberto Rocha da Silva

Dois de novembro é o único dia em que celebrar a morte não é visto como algo mórbido; ao contrário, os vivos alimentam lembranças e renovam homenagens aos que morreram. O homem ainda não consegue discutir a morte de forma explícita; por isso, escamoteia sua presença, tornando-a um tabu. A impossibilidade do ser humano em vencer esse 'inimigo' teve na arte o mecanismo para enganar o sentimento associado ao fim, transformando a finitude em superação. Expressar sentimentos por meio da imagem é transformar uma realidade em outra, alimentando um imaginário com a certeza de que o que está sendo retratado no conjunto artístico do cemitério eterniza momentos inesquecíveis vividos pelos familiares e o ente querido. Anjos, alegorias e Cristos tornaram-se subterfúgios para a dor da perda.
O autor Walter Taam Filho, nas suas reflexões sobre a morte, faz-nos perceber a riqueza das imagens produzidas durante séculos na cultura ocidental e as mudanças na interpretação da idéia do fim da vida. Na Antigüidade, a morte não era representada com traços macabros, mas como um sono eterno, pelas figuras mitológicas de Tânatos e Hipno. Na Idade Média, essa visão muda completamente, pois a familiaridade com a morte – devido a pestes e guerras – irá formar um novo imaginário popular. Ela será macabra e com traços mórbidos. Com o cientificismo, há uma nova concepção; o homem do Renascimento substitui a fé pela ciência. Sua representação aparece associada ao falecido e o medo será pela interferência da morte no tempo. Com o Romantismo, a morte passa a ser admirada e qualquer traço de fealdade é substituído pela beleza. Para encerrar, Taam Filho mostra que, no período Moderno, os homens desvalorizam superstições e mitos criados para driblar a morte, pois o progresso da ciência, somado ao perfil crítico de explicarem questões relacionadas ao seu desenlace, é entendido por respostas calcadas em provas técnicas e científicas. No século XIX, a morte torna-se escamoteada, um tabu. Há uma recusa do homem, verificada na falta de discussão sobre o tema e na percepção de achar que somente o outro pode morrer.
No imaginário social, os cemitérios corporificam símbolos e alegorias presentes na arte tumular que, de alguma forma, substituem os mortos. Essa arte é um discurso do homem para a percepção da morte diante de suas apreensões e dúvidas. Ao irmos ao cemitério, estamos glorificando a memória dos falecidos ou buscando mais uma forma de aliviar a dor da perda?

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